Lendas de Vila Nova de Poiares - Registo de lendas “contadas” no Concelho de Vila Nova de Poiares
Em virtude de vários pedidos, principalmente para trabalhos escolares, junto publico estas lendas que fomos registando oralmente e que por vezes não eram mais de três ou quatro frases, mas que compusemos e romanceamos de acordo com o estilo das lendas do nosso país.
Esperamos ter dado um contributo.
Registo
de lendas “contadas” no Concelho de Vila Nova de Poiares
Lenda
da Chanfana*
Lenda contada/narrada por: Pedro Santos
Conta uma lenda de Vila Nova
de Poiares que terá sido um pastor de gado caprino chamado “Ti Henrique” do lugar
de Olho Marinho em Vila Nova de Poiares que ao ver que uma cabra do seu rebanho
de nome “Malhada” estava a ficar velha e sem préstimo, pois já não dava leite
para fazer o queijo nem paria cabritos grande fonte de rendimento, resolveu fazer
uma “iguaria” a que chamou “Chanfana”.
Assim juntou os utensílios e ingredientes necessários para fazer essa “Chanfana”: um caçoilo de barro preto, feito no Olho Marinho; juntou vinho bom do Pereiro e temperos que tinha, ao que aproveitando o calor de uma fornada de pão de testa que acabava de sair do forno, deixou lá o dito caçoilo. No dia seguinte foi degustar a carne e verificou que o vinho a tinha amaciado ficando muito saborosa. Foi também uma forma de conservar a carne assada por muito mais tempo. Assim acabou por inventar este maravilhoso prato gastronómico a que a população de Poyares, passou a chamar “Chanfana”.
* A Lenda da Chanfana conta inúmeras presenças de aspectos do Património Imaterial do hoje concelho de Vila Nova de Poiares, descrevendo historicamente este território em termos de Memória Colectiva e Identitária, numa certeza de ter aparecido (sido inventado) do saber e necessidade popular das terras simples e gentes do campo.
Lenda
de Dom Afonso Henriques
Lenda contada/narrada pelo Cronista – Mor, Duarte Galvão e por diversos escritores do século XIX, nomeadamente o Bispo Negro de Alexandre Herculano. Adaptado por: Pedro Santos
No Séc. XII o Papa Honório II, enviou um Cardeal – Legado devido à queixa que D. Teresa, mãe de D. Afonso Henriques, lhe fizera depois da batalha de São Mamede informando-o de que seu filho a mantinha presa, segundo um antigo costume.
Em Coimbra terá o rei
questionado este mensageiro papal!
«- Então a que vindes,
cardeal amigo? Trazeis-me dinheiro para custear a guerra que, noite e dia, ando
há tantos anos a fazer aos mouros? Se trazeis, desatai a bolsa, se não, tratai
de rodar e volver para onde viestes.
- Venho do mando do Santo
Padre ensinar-vos a fé de Cristo ...
- Ensinar-me a mim a fé de
Cristo ... ?!
- Então o credo que cá se
usa não é o mesmo que em Roma ? Ouvide lá...
E D. Afonso Henriques,
recitou-lhe tim-tim por tim-tim o símbolo dos apóstolos tal como vigorava por
toda a cristandade.
- Hem ? Já sabeis que não
estou em falso. Mas, bem, bem, ide repousar, que se faz tarde, e amanhã
falaremos.
Recolhendo o cardeal à
pousada, in-contenti mandou os arreios deitar ração de cevada às mulas e
aprestar para partir. Meia noite dada, acudiram os clérigos à sua convocação,
ensonados uns, cara de caso outros. E, perante todos eles, boquiabertos,
excomungou a cidade e o reino. Isto feito, cavalgou, e ainda a manhã não fora,
tinha botado mais de duas léguas de Coimbra.
Quando, ao levantar, D.
Afonso Henriques o soube, pediu que lhe trouxessem o cavalo mais veloz. Foi-lhe
nascer o sol, levado num furioso galope a corta mato, em Vimieiro a par de
Poiares.[1] Um pouco mais adiante
avistou o cardeal legado que choutava com a comitiva. E, correndo para ele, sem
tirte nem guarte, deitou-lhe a mão esquerda ao cabeção, ao passo que com a
direita desembainhava a espada:
- Espera traidor, que é hoje
o teu último dia ! ...
Interpuseram-se os
cavaleiros que o tinham seguido à carga cerrada :
- Não o mateis, senhor, que
então é que vos tomam por herege verdadeiro !
- Seja, não o mato, mas
há-de desfazer e já tudo quanto fez ...
- Senhor – gemeu o cardeal –
tudo o que vós quiserdes eu o farei de boamente.
- Então desexcomungai quanto
excomungastes ...
- Senhor, eu o desexcomungo
em nome do Padre, do Filho e do Espirito Santo.
- Prantai para fora dos
alforges quanto levais ... Prata, oiro, e mais coisas de valia ...
Os arrieiros esvaziaram os
alforges que, de facto, iam a abarrotar de preciosidades.
- Deixai também as bestas,
que preciso delas para a guerra. Bastam-vos três ...
Resignou-se o legado a
cumprir mais esta condição, julgando que era a derradeira.
- Tomai agora o compromisso
de que, mal chegardes a Roma, me enviareis um breve de Sua Santidade, breve em
que se declare com todos os ff e rr que nunca mais em tempo algum eu e
Portucal, que ganhei com esta espada, serão excomungados ...
Assumiu o cardeal, e Afonso
Henriques fez saber qual a condição final, aceite aliás submissamente como as
demais. O sobrinho do cardeal ficava em refém até chegar o breve de Roma. Se no
prazo de quatro meses não viesse, então não havia nada a fazer, e cortava-lhe a
cabeça.
El-Rei, depois, despiu o
pelote[2], desafivelou a loriga[3] perante os olhos estupefactos do legado e
dos cavaleiros. E mostrando o peito lanzudo coberto de cicatrizes e gilvazes,
em voz cava, martelada, proferiu:
- Cardeal, fazei-me o favor
de dizer a Sua Santidade que vos pus bem à vista a cartilha das minhas heresias
...
E um por um foi apontando os
golpes e enunciando as cidades e vilas e lugares de peleja onde os tinha
apanhado. E em voz patética concluiu:
- Todos estes lanhos e
talhadas recebi na batalha contra os inimigos da nossa Santa Fé. Dizei ao Papa.
Tendo chegado a Roma, quis
desautorizá-lo o Sumo Pontífice com recusar-lhe a Letra prometida a par das
infalíveis censuras. Respondeu-lhe o Cardeal – Legado.
- Senhor Santo Padre, se vós
vos víreis, nos assados em que eu me vi, um homenzarrão daqueles a agarrar-vos
a cabeça com a mão esquerda, a espada na mão direita, o cavalo, grande como uma
torre, a escavar a terra parecendo que vos estava a abrir a cova, ah, não daríeis
apenas uma bula, mas a própria cadeira de São Pedro“.
Nota: Versão extraída da obra de Aquilino Ribeiro do século XIX, adaptação Pedro Carvalho Santos.
Lenda
do Cabrito
Lenda popular de Poiares, Registo base e adaptação da Lenda: Pedro Santos.
Conta-se que há muito tempo
num caminho do lugar do Carvalho para o lugar das Ribas, indo uns homens nos
seus afazeres, no sítio conhecido por Vale do Soito, apareceu um cabrito.
Pensando eles que havia sido um animal perdido de um rebanho, logo um deles o
carregou às costas.
Passado um tempo de
caminhada, junto à Capelinha de Santo António o cabrito “mijou”, molhando as
costas do homem que o carregava ao que este exclamou:
- Há ladrão que me mijaste!
Ao que o cabrito respondeu:
Então atirando-se o
animal/diabo rapidamente ao chão, subiu um barroco desaparecendo.
Tudo parecia estourar,
grande vendaval se instalou e as arvores estremeciam assim como a natureza, que
ficou instável.
A partir desse acontecimento ao passar ali a população da aldeia das ribas quando ia para o lugar do carvalho, tinha grande medo e temor, tendo assim ficado aquele lugar ligado à lenda do cabrito.
Lenda
da Peneda da Moira
Lenda popular de Poiares, Registo base e adaptação da Lenda: Pedro Santos
Conta uma lenda de São Miguel de
Poiares, que uma bela Princesa Moura, apaixonou-se por um Príncipe Cristão
tendo nascido deste enlace uma criança. O Rei pai da Princesa deu-lhe um
horrível castigo. A Princesa foi expulsa e teve que carregar na viagem um penedo,
que levava á cabeça; ir a fiar e com a criança filha do Cristão ao colo.
Depois de muitos dias de viagem,
exausta parou em São Miguel de Poiares no local da Fraga, onde ainda hoje se
pode ver o Penedo da Moira, tornando-se numa Moura Encantada.
Anos mais tarde um Homem que descia do
lugar de Alveite Grande para São Miguel de Poiares passou junto ao Penedo e
reparou que existia um prato com figos junto ao buraco do Penedo. Ele tirou um
figo ao que uma voz lá de dentro disse:
- “tira mais”!
Mas ele assustado fugiu desesperado.
Estando já longe foi para comer o figo, mas surpreendeu-se com um figo de ouro!
Então voltou ao pé do Penedo, mas o
prato já não estava lá. Ao remexer a terra uma forte voz veio de dentro do
Penedo e disse:
- Tivesses apanhado mais que eu bem
te disse.