Confrarias Irmandades Associações

Confrarias e Confrarias Gastronómicas
A Confraria da Chanfana


Abordemos ligeiramente o tema “Confrarias”.
Este nome num país de fortes tradições religiosas como o nosso leva-nos logo para a questão das Confrarias Religiosas. De certo modo correcto. As confrarias são sinónimos de Irmandades, Misericórdias ou Sociedades, mas acima de tudo poderemos dizer que são um conjunto de pessoas que se dedicam à mesma “causa”ou que exercem a mesma profissão, têm o mesmo modo de vida, representam um mesmo ideal, identificam-se pelos mesmos valores etc. etc.
Popularmente a Confraria de São Martinho é conhecida como a Confraria dos Embriagados (bêbados), tendo o objectivo e termo Confraria aqui um sentido depreciativo.
No entanto é claro que não é este que impera e as Confrarias em Portugal como o são em Espanha tem um sentido de Corporações e Irmandades. Na Galiza impera o termo Irmandade, sendo que Confraria esta mais associado a agremiações e associações de pescadores, agricultores e de outras profissões.
No tempo do Império Romano, o termo Confraria já tem significado, sendo que sabemos que já existiam Corporações que defendias produtos ou classes (caso das Confrarias ou agremiações de Vinho ou de profissões, caso dos padeiros). Era normal que as Confrarias estivessem organizadas sob as posturas e regulamentos das cidades onde elas se encontravam. Os “colégios” (Confrarias) tinham uma enorme importância e influência, como se depreende, particularmente pela capacidade de associar gente do mesmo ofício e com os mesmos objectivos, mostrando prova de união de esforços e vontades dentro dos objectivos traçados.
As primeiras Confrarias foram as báquicas, sendo no entanto credível que as gastronómicas já existissem, expressando-se no entanto de maneira diferente das primeiras.
No entanto é na Idade Média que as confrarias em particular as de ofícios tem maior repercussão. Muitas delas eram associadas a ofícios mas também existiam as religiosas. Estes aspectos variavam de país para país e até de região para região. No caso concreto do distrito de Coimbra eram inúmeros os colégios, conventos, casas religiosas.
Ainda hoje chama-se a rua dos sapateiros, dos correeiros, dos padeiros e outros que mais não são do que reminiscências de antigos locais onde estavam associadas profissões.
Também não deixa de ser interessante quando na nossa terra ouvimos falar (nomedamente quando das festas populares), do Juiz da Festa ou dos Mordomos! Pois bem, é que apesar de hoje não se falar tanto em Confrarias, em Terras de Poyares, existiram inúmeras Confrarias, em Santa Maria da Arrifana, em São Miguel Arcanjo, em Santo André de Poyares (Confraria do Santíssimo) assim como a Confraria, que deu lugar a Irmandade de Nossa Senhora das Necessidades já em finais de Oitocentos. Quanto a esses termos de títulos e cargos mais não são o que nos ficou desse passado recente.
Como podemos verificar os termos das Confrarias Gastronómicas hoje tão em voga e moda, mais não são que Associações Culturais que buscam nas antigas Confrarias ícones antigos.
As Confrarias podem ter Mordomias, onde existem os Mordomos, sendo que um deles é o maior, o Mordomo Mor, assim como um Juiz há semelhança das antigas instituições. No entanto também há as que optam por ter uma Chancelaria e então quem esta há frente será um Chanceler. Surgem depois termos como Grão Mestre e outros de acordo com os Estatutos e Regulamentos de cada Instituição. Curioso também são as vestes. Sem duvida baseadas em trajes antigos nomeadamente clericais como o caso das «opas», os mantos, o medalhão, ou até mesmo a vara ou bastão, símbolo de poder desde sempre de Imperadores, Reis, Sultões, religioso e outros, tendo sempre esse carácter de afirmação de poder.
Hoje as Confrarias Gastronómicas desempenham um papel «assas» importante na Cultura, no progresso e desenvolvimento dos povos, sendo importantes parceiros sociais.
As Confrarias acabam por ser elitistas e não pensemos na palavra com o carácter isolado que tem, mas acabam por ser realmente instituições que escolhem os seus membros geralmente com critérios internos rígidos não buscando a generalidade ou a massificação de membros.
Entendemos até que no caso do nosso país que talvez seja a busca daquele brilho que historicamente reforça a identidade de um povo, a sua cultura, o seu saber, talvez até o carácter dessa monarquia que ninguém quer mas que quase todos cobiçam e admiram pela intemporalidade que todo este tema reveste e que uma república nunca consegue marcar e vingar. (talvez só a Republica Francesa pela razão que historicamente conhecemos e o sistema Americano pela convicção que tem, e mesmo aqui a admiração pela coroa britânica é tão evidente que até a família Kenidy ainda há pouco tempo era conhecida por a família real americana).
As Confrarias que tem aparecido desde Oitocentos na Europa, em particular França, Espanha e agora ultimamente no nosso país, surgem da iniciativa dos seus primeiros membros, geralmente os fundadores, ou seja os que assinam geralmente a escritura pública.
Tem sido comum verificar que estas Associações, surgem da mais variada maneira! Por vontade de alguns quadrantes económicos, caso de restaurantes, de Associações já existentes, de Cooperativas, de Quintas Agrícolas ou ligadas ao Turismo, algumas com ligações de Casas Religiosas assim como de Autarquias (Câmaras e Juntas de Freguesia) enfim uma panóplia de circunstancias que leva ao aparecimento destas Associações, baptizadas de Confrarias.
Lógico será de compreender que sendo uma “coisa” boa para a promoção de produtos originais (passemos o estrangeirismo de “Endógenos”) de cada terra, tem um peso deveras importante designadamente ao nível local e regional.
Em todas as terras por onde temos tido possibilidade de visitar nota-se um interesse grande por parte das “forças vivas” e elites locais, independentemente de ser no nosso país ou noutro país Europeu.
No entanto também aqui a questão não é pacifica e há boa maneira portuguesa está de criar essa inércia já típica de não fazer e não deixar fazer! Será assim talvez mais fácil de entender, que sendo estas Associações iniciativas de quem as pensa primeiro e coloca em pratica, gere motivo de inveja e cobiça a quem verificando que este assunto é uma “coisa” boa deseje o mesmo!
Assim sendo até que é de incentivar este interesse, pois será toda esta corrente de iniciativas que levam estes e outros caminhos a bom “porto”! Porem é de lamentar que não surja toda essa força e pujança para desenvolver integradamente e com respeito, as terras e que em vez disso surjam atoardas de quem chega atrasado ao assunto fazendo birra como uma criança e criando desuniões que só lembram caciques tão bem retractadas pelos escritores do século XIX. (Julgo que os nossos leitores reconheçam a quem nos referimos)
Há neste momento inúmeras Confrarias em Portugal e a tendência é para aumentarem fortemente. Umas são báquicas, outras Gastronómicas, curiosamente também há as das duas coisas, e até uma Confraria que nem é duma coisa nem doutra como a da Água. Depois temos também as de escritores como Aquilino, Camões, Eça (que terão como objectivo defender pratos por estes escritores divulgados em obras literárias) assim como outras que ainda nem tão pouco sabemos concretamente o que é que defendem.
Em reunião de Câmara de 1 de Março de 1999 foi deliberado criar uma Associação Cultural de nome – Confraria da Chanfana. Ratificada a 30 de Abril do mês seguinte pela Assembleia Municipal, estava dado o primeiro passo para o sucesso, “...de uma das mais dinâmicas...“ Confrarias de Portugal! (Citação no livro «A Chanfana – Ex –Libris da Gastronomia Regional» pela FNCGP referindo-se à Confraria da Chanfana)
A escritura pública desta nova Associação Cultural foi efectuada em 22 de Agosto de 2001, celebrada no Cartório Notarial de Vila Nova de Poiares e contou com os seguintes confrades fundadores: Câmara Municipal de Vila Nova de Poiares, Associação de Desenvolvimento Integrado de Poiares, Associação Portuguesa dos pais e Amigos da Criança Deficiente Mental, Cooperativa Santo André, Rádio e Cultura CRL, as quatro Juntas de Freguesia do Concelho, Poiares, Arrifana, São Miguel e Lavegadas e o senhor Presidente da Câmara Municipal a título individual.
A Confraria nasceu do querer e determinação do senhor Presidente da Câmara Municipal, que reuniu à sua volta algumas das mais prestigiadas instituições do concelho, consciente da importância da Gastronomia no panorama cultural do país e do seu valor intrínseco na promoção e no crescimento de uma região.
Assim, em 23 de Setembro de 2001 foi apresentada à comunidade poiarense e à comunicação social, esta nova Confraria, cujos princípios tem procurado aprofundar todos os dias. Estiveram presentes nesta sessão, realizada nos Paços do Concelho, o senhor Governador Civil do Distrito de Coimbra (na altura o Prof. Horácio Antunes), os Confrades Fundadores, Instituições e personalidades que desde sempre nos apoiaram: Eng.º Leite Gomes – em representação da Federação Nacional das Confrarias da Gastronomia Portuguesa; Dr. Mário Nunes do Grupo de Arqueologia e Arte do Centro; Dr. José Manuel Alves - em representação da Região de Turismo do Centro; Confraria da Panela ao Lume; Comunicação Social.
Trazer à lembrança de todos, as origens e as tradições de cozinha poiarense, portuguesa e muito particularmente a da Região das Beiras é um acto simbólico, que a Confraria da Chanfana quer assinalar, consciente do seu papel na preservação e difusão dos padrões de qualidade.
Abordaremos agora as insígnias: “A Confraria da Chanfana tem como traje, um manto preto com sobrecapa (opa) grená, de acordo com a simbologia que estas cores representam e num tecido confortável e leve que se adapte às várias estações do ano. O grená, cor das labaredas que crepitam nos fornos de lenha e do vinho carrascão utilizado no tempero; o preto, a cor da fuligem e dos caçoilos onde se confecciona a chanfana. Tem também um medalhão, em bronze suspenso por uma fita de cetim dupla em preto e grená com o logotipo contendo um forno de lenha, caçoilos de barro preto e a cabeça de uma cabra, símbolo que outrora se traduziu na actividade dominante. A vara do Juiz e do Mordomo – Mor em preto e com logotipo pintado, em cima, usada para presidir a todas as manifestações públicas da Confraria.” (cit. Livro A Chanfana – Ex – Libris da Gastronomia Regional)
Os Confrades ou Confreiras (podemos também chamar Consóror no termo feminino), fazem um juramento no Grande Capítulo Anual (a festa por excelência da Confraria), na altura que integram a instituição. O juramento da Confraria da Chanfana tem o seguinte texto: «Juro em consciência e honra defender pública e solenemente em qualquer momento ou lugar, a Chanfana, defender as suas virtudes, salientar a sua nobreza e promovê-la enquanto símbolo ancestral e tradicional das nossas gentes; Juro ainda, exigir a sua confecção com carne de cabra, vinho tinto de qualidade em caçoilos de barro preto, fornos tradicionais e levá-lo ao mais alto grau que o seu delicioso e inesquecível sabor lhe confere; Juro, por último, manter uma relação de fraternidade, amizade e respeito entre todos os confrades desta ordem, com vista à defesa das tradições, costumes e produtos da nossa terra, de Vila Nova de Poiares.»
A Confraria da Chanfana realiza a sua festa anual no mês de Setembro e o seu programa é integrado na POIARTES, a Feira Nacional de Artesanato e Mostra Gastronómica que o Município de Vila Nova de Poiares realiza anualmente no segundo fim de semana de Setembro.
No III Grande Capítulo, serão entronizados os novos Confrades Efectivos (os que possuem o traje, chapéu e escapulário/ colar com o medalhão) e os Confrades de Honra, que só usam o escapulário e que enobrecem a Instituição. Neste momento a Confraria já conta com alguns Confrades de Honra. O Dr. Fernando Antunes, o Prof. José Dias Coimbra, o Prof. Horácio Antunes, o senhor Fernando Caldeira Marques, o Professor Doutor Barbosa de Melo, o senhor Amílcar Malhó, o Dr. Paulo Pereira Coelho, o Dr. Carlos Candal, o Prof. Doutor Marçal Grilo e o senhor Hélio Loureiro, Eusébio, Scolári, Doutor Manuel Antunes, Prof. Doutor Barbosa de Melo, Luís Lavrador, Hélio Loureiro, André Sardet, José Luís Alé, Dra. Luísa Fortes da Cunha, Padre Victor Melícias, Eng. Victor Alves Ribeiro e tantos outros.
Este ano de 2006 serão entronizados outros nomes que engrandeceram o nome da já prestigiada Confraria da Chanfana, que por onde se desloca já possue um curricullum cheio de palmares e de respeito na família gastronómica nacional e europeia.
A Confraria da Chanfana possue um restaurante onde pode exemplificar a gastronomia típica de Poiares e da Região das Beiras. O Restaurante “O Confrade” situa-se no Edifício Municipal do Mercado e é há Câmara Municipal na figura do seu Presidente que a Confraria deve tão grande benesse! O senhor Presidente da Câmara Municipal propôs a cedência do espaço, em pleno coração da Vila Sede de Concelho, podendo assim a Confraria usufruir de tão nobre localização. A sua sede é nesse mesmo lugar em sala anexa, onde a Confraria possue todos os presentes que lhe são oferecidos, assim como livros gastronómicos que dentro em breve poderão vir a ser a base de uma pequena biblioteca temática.

Mais Pedaços da História de Poyares

Iniciamos neste ano de 2006 um conjunto de temas que pretendem antes de mais ser a continuação de um trabalho que tem vindo a ser desenvolvido há alguns anos e que tem por principal objectivo comentar as gentes e a História de Vila Nova de Poiares, bem como a Região Beirã onde este concelho se integra.
Concelho que faz a ponte do Litoral e Interior, Vila Nova de Poiares tem uma posição privilegiada no panorama do Distrito de Coimbra, sendo hoje uma referência no próprio mapa distrital.
Vila Nova de Poiares é um concelho herdeiro dum passado histórico rico. A inexistência de imponentes construções, ou de títulos de nobreza, ofuscam essa realidade! As gentes das Terras de Poiares, foram sempre gentes de trabalho, de coragem que nunca desistiram em alturas difíceis! Durante séculos os habitantes das Terras de Poiares pediram para serem autónomos como concelho, resistiram a duas tentativas de suprimento e “sofreram” a redução das suas fronteiras fez o ano que terminou 150 anos.
Os limites e influencias das Terras de Poiares foram muito mais distantes do que hoje conhecemos possuindo domínios em Ervedal da Beira, hoje uma freguesia histórica de Oliveira do Hospital.
O ano que deixamos de 2005, é Histórico para o Concelho de Vila Nova de Poiares!
O ano passou marcou o centenário da elevação de Poiares a VILA. Foi em 1905, reinava então D. Carlos, que o concelho viu elevada a sua sede de concelho à categoria de VILA.
Apesar da importância que esse facto revela, ele tem uma maior profundidade se pensarmos que a restauração definitiva do concelho havia sido apenas há 7 anos e a insegurança política era ainda acentuada. Quem poderia garantir que o concelho não fosse novamente suprimido?
Pensamos, inclusive que esta benesse real além de ter vincado a autonomia do concelho, estabelecia definitivamente a sede do concelho! Sede essa que ficaria em S.to André e não em Santa Maria, herdeira legitima da Arrifana e Terras de Poyares, com ligações religiosas à Universidade de Coimbra, com um passado grandioso como Vara Concelhia do Antigo Regime! Era a esta que tinham sido dadas as rendas de Friúmes, “Homeres” e o Ervedal da Beira desde os tempos das Infantas, inicio da nacionalidade.
A Vila de Poiares (de Santo André de Poyares), era agora a “cabeça” do concelho. Era aí que se encontravam os Paços do Concelho (o Palacete que referiam os Oitocentistas); era aí que se realizavam as Feiras, grandes pólos atractivos de pessoas; era ai que se encontravam e reuniam as Elites Locais! Com a Estrada da Beira construída e o Caminho de Ferro até Serpins (com a perspectiva de chegar até ao concelho de Arganil e um ramal até Poiares), o tráfego fluvial do Mondego começa lentamente a deixar de ter a importância de outrora.
Lourêdo, esse porto fluvial que viu as madeiras dos Paços do Concelho chegarem das matas de Leiria, foi um porto activo particularmente no Século XIX, com maior destaque desde a criação do concelho, em 1836. No entanto só durante 19 anos fez dupla com o porto da Raiva (integrado no primitivo traçado), porque em 1855, fruto de uma enorme cobiça e inveja, alguém “traça” no Terreiro do Paço os novos limites concelhios para apaziguar os ânimos dos nossos vizinhos.
O facto do Concelho ter tido todas estas dificuldades de afirmação, acabou por criar uma situação histórica difícil, na medida em que pouco se fala na data de nascimento do concelho (1836), pouco se fala da redução das fronteiras em 1855 ou dos suprimentos de 1867/1895! Em geral dá-se só ênfase à Restauração de 1898, chegando-se mesmo a criar erros históricos frequentes ao negar o período do concelho de 1836 a 1898!