Natal
Natal
– Festa da família
(Texto
Integral)
O período de final de ano
civil coincide com as festas de Natal e fim de ano.
Existem lugares no mundo onde o nascimento de Cristo não é oficialmente celebrado
por uma questão de liberdade religiosa, sendo essa festividade designada de
Festa da Família.
O Natal em Portugal
associa-se à família, ao inverno, à lareira, à neve, aos presentes, à nossa
mesa gastronómica e báquica, mas acima de tudo ao nascimento de Cristo. No
Natal partilham-se os presentes que, acima de tudo, deveriam lembrar o presente
que Deus nos deu, Jesus Cristo, assim como os presentes dos Magos do Oriente a
Jesus.
A celebração do Natal terá
tido origem em festas Celtas, de povos que habitaram o Norte da Europa,
referenciando o culto dos mortos. Estas cerimónias antigas remontam ao
Neolítico, associando-se à sucessão das estações do ano - os equinócios e
solstícios. O ano Celta iniciava-se em novembro, com a celebração dia dos
mortos, que a cultura anglófona transportou para o resto do mundo com o
Halloween, persistindo na nossa cultura religiosa a comemoração do Dia de todos
os Santos.
Em Portugal temos a tradição
de construir o presépio contando a história do que supomos ter sido o nascimento
de Jesus, utilizando imagens da nossa Tradição, Identidade e Memória. Os
presépios existiam só em casas abastadas e mais ricas, e em Poiares existiam poucos,
há alguns anos era possível deleitar-nos com um presépio privado de Machado de
Castro, numa caixa de madeira com vidros de grande tamanho, com as várias
figuras e cenários do nascimento no menino. A Estrela, que está sempre presente
no presépio ou na árvore não só representa o elemento que conduziu os Magos a
Jesus em Belém, mas a estrela do bem que nos deveria guiar nesse caminho para
os pressupostos de Cristo. Tudo isto culminando na Família. Jesus nasce dentro
de uma família, como todos nós, fazendo parte da família de Deus. Independentemente
das convicções religiosas de cada um, deveria ser esta a mensagem das festas de
Natal.
O Natal no concelho de Vila
Nova de Poiares é festejado desde a sua fundação e possivelmente desde sempre
nessa tradição portuguesa. Em jornais, revistas, boletins podemos confirmar
isso mesmo desde o século XIX. O Natal é hoje comemorado de forma diferente de
quando o nosso concelho nasceu em 1836. Mantém-se, no entanto, a característica
da reunião familiar. Vindas de vários locais de Portugal (nomeadamente dos
grandes centros como Lisboa e Porto) e de vários países do mundo, as famílias
reencontram-se nos locais mais tradicionais, que de algum modo os ligam às suas
origens. Juntam-se à volta da mesa natalícia, cumprindo tradições que passam de
geração em geração.
O período em que decorrem as
festividades natalícias varia de país para país. No Norte da Europa, como é o
caso da Suécia, as festas de Natal começam a 6 de dezembro, dia de São Nicolau,
daqui a origem a tradição do pai Natal, devido às prendas que São Nicolau oferecia.
Aqui a árvore de Natal primitiva não era enfeitada, só posteriormente iluminada
e decorada, dando luz e cor ao Natal que hoje todos conhecemos.
Em Portugal a árvore de
Natal foi introduzida pelo Rei D. Fernando, consorte da Rainha D. Maria II,
monarca reinante aquando do nascimento do nosso concelho, “Santo André de
Poyares”. D. Fernando foi um rei culto, apelidado de “o rei artista”, oriundo
do Norte da Europa, da grande Casa Saxónia, Coburgo e Gota, de entre muitas
obras dignas de nota, mandou construir “a expensas suas” o Palácio da Pena em
Sintra, referência na Europa e no mundo.
No nosso concelho as
iluminações no século XIX e inícios do século passado eram de candeias de
azeite, candeeiros a petróleo, velas e só mais tarde a gasómetros, iluminando a
escuridão das nossas aldeias, em virtude da eletrificação só se ter realizado
muito mais tarde, a partir das décadas de 50 e 60, do século XX. Num anúncio ao
“azeite” que passa regularmente nas televisões na época natalícia, alude-se à consoada,
às tradições e ao som do: “ò rama, ò que linda rama, ò rama da oliveira, o meu
par é o mais lindo, que anda aqui na roda inteira” …, inspirando-nos na própria
identidade Portuguesa com esse “oiro” líquido das nossas oliveiras que “regam”
o “fiel amigo”, o bacalhau, numa clara alusão à família, ao convívio, às nossas
tradições. Numa lareira quente, a mesa da sala grande, possivelmente com uma
braseira, o crepitar das “carcódoas” de pinho, está o “bafo” quente, hoje, …
porque “dantes” era dos animais, … lá fora está o frio ou a neve e as árvores
“despidas”! É assim o Natal, a nossa terra, é assim a tradição do nosso país. Esta
é a verdadeira imagem de Natal, não um Natal de consumismo e compras a que a
todos se habituaram, onde o pai Natal é Vermelho (talvez do refrigerante
Americano) e incentiva o comércio e a indústria do consumo.
A consoada, fosse mais rica
ou mais pobre, era sempre “um rancho melhorado”. As Terras de Poyares sempre
foram ligadas ao azeite, com pratos regados do precioso líquido. Desde que
Santo André de Poyares surge como concelho, temos registos da venda de
bacalhau. O “fiel amigo” terá sido rei em algumas mesas Poyaristas. Digo
algumas, porque estaria longe da bolsa de muitas famílias, a pobreza também
grassava! A Tibornada, alguidar de barro vidrado, terá tido o seu início nos
lagares do concelho e região. Pão, couves e batatas cozidas, bacalhau, regado com
azeite, sem esquecer a “cabeça desmembrada” do alho que lhe oferece o sabor
peculiar, tudo em camadas. Para quem não gosta desta “misturada tradicional”
ficamos pelo prato normal de bacalhau com batatas, ovo e couves cozidas,
misturando por vezes o miolo de broa ou pão. A consoada, noite de Natal, será
sempre uma noite mágica, principalmente para quem tem sentido Cristão.
Materializa uma refeição simples talvez de “consolo”.
Mas com o decorrer dos
tempos outros pratos e outros gostos se juntaram à mesa Poiarense, seja para a
noite de Natal, seja para o almoço do dia de Natal. O peru veio das Américas
com frutos tropicais, assado e/ou recheado. De Portugal e das Beiras, saberes e
sabores de cabrito (também destas “Terras Poyaristas”); quem sabe em alguma
casa a chanfana ou o chispe; o leitão assado de outras regiões, algumas
vizinhas; o polvo no forno, mais do litoral; lombo ou vitela assada; galo,
galinha gorda, ou capão; enfim, um prato melhorado e por vezes um
aproveitamento do que sobrou da “Tiborna”, uma “roupa velha”. Nem sempre a vida
sorriu! Também esta Terra de Marchantes e Comerciantes marcou um cardápio de
variedade gastronómica, típico de Portugal.
No final do repasto,
segue-se, para muitos crentes, a missa do galo, momento máximo da noite, dando um
verdadeiro sentido ao Natal cristão. Ali nas Igrejas avistavam-se as figuras do
presépio, geralmente só as principais de tamanho maior. As figurinhas do
presépio como hoje as conhecemos, foram como tantas outras tradições que
existem hoje difundidas e generalizadas há cerca de 50 anos. Depois da missa do
galo é hora de regressar a casa onde se comiam pinhões, que por vezes ainda
estavam nas pinhas, que se aqueciam ao lume para abrirem. As passas de uvas que
estavam penduradas nas adegas e lojas desde as vindimas de setembro também se
degustavam, “doces como o mel”. Figos secos, avelãs, nozes, amêndoas, ameixas,
alperces, e outras frutas, secas e cristalizadas pelo açúcar natural, eram as
guloseimas dos produtos que a Terra dava. Nas casas da maioria dos Poyaristas
no que toca aos doces, eram rainhas as filhoses. Com açúcar? Talvez poucos, era
mais comum com mel, pois o açúcar era caro e não havia em abundancia. Rabanadas,
ou fatias douradas, com calda doce, sonhos, arroz doce, pudim, leite creme e
broinhas. Maçãs assadas com açúcar ou mel e sempre “melaços”, porque o primeiro
era caro, ou outras gulodices, para alguns as únicas ao longo do ano, porque os
tempos eram de aperto e só talvez em casas mais ricas poderia aparecer um bolo
rei, porque nas outras nem em sonho!
Nesta quadra a música estava
sempre presente, com um grande tronco de oliveira ou carvalho na lareira, um
bandolim ou braguesa, um cavaquinho ou pandeireta, quem sabe um acordeão,
cantava-se muito na noite de Natal. Quanto à tradição do sapatinho, lá para os
lados do Pereiro era um “tamanquinho”, só na manhã do dia de Natal se
encontrava um rebuçado, alguma “lambeta” ou lambarice.
Tempos antigos desde o
nascimento deste concelho com mais de 180 anos. Tempos difíceis que eram
amenizados na altura do Natal, das festas do menino, da magia das festas
religiosas, num tempo de trabalho árduo para a maioria dos que viviam nestas
Terras. Para outros, proprietários de terras e comerciantes, uma vida mais
“doce” e facilitada. Para todos um sentimento de comemorar o Natal, esse
nascimento do “Deus Menino”.
“ Não negoceio o Natal.
A magia do Natal são dois meses de cor e luz, com sinos e
sons.
Terminados os finados, festejamos até aos Reis, esses
Magos do Oriente que vieram adorar o menino.
O Natal é apenas o nascimento, … e esqueçamos a folia com
compras e arrelias!
O Natal é um colorido, uma explosão de força e alegria.
É difícil haver período tão lindo e cheio de virtude,
durante todo o ano nem o calor do Verão acalenta este amor.
Natal é Festa de Família, de tréguas e amizades, assim
como Rancho melhorado.
O Presépio é uma história contada, em Portugal, os usos e
costumes, a tradição e a memória.
É a nossa identidade mostrando o nascimento do Deus
menino nas palhas deitado desde o nascer da aurora.
Com sons e alegria, com luzes e simpatia, comemoramos o
Natal com esperança Universal.”
A todos um Santo e Feliz
Natal de 2018.
Pedro Carvalho Santos o fez,
na Casa da Lomba d’ Aboreira em Risca – Silva em Dezembro de 2018